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Audiência aponta políticas públicas voltadas à população trans e travesti    

Publicado em 09/02/2023 14h52

Foto: Renan Lisboa (estagiário)/CLDF

Fábio Félix se comprometeu a financiar a disponibilização de hormônio pela SES via emenda parlamentar e apresentar projeto de lei de sobre a atenção geral à saúde da população trans

Audiência pública sobre a garantia de direitos para a População Trans e Travesti, realizada pela Câmara Legislativa nessa quinta-feira (9), debateu a necessidade de fortalecimento de políticas pública para o segmento, com ênfase na saúde. Segundo o presidente da Comissão de Defesa dos Direitos Humanos, Cidadania, Ética e Decoro Parlamentar, Fábio Félix (Psol), essa população é a que mais sofre dificuldade de acesso aos serviços públicos. “Discutir política pública para a população trans é uma urgência necessária no poder legislativo”, enfatizou.

Autor da iniciativa, Felix disse que “houve um projeto de estímulo à violência no último período”, referindo-se principalmente ao Governo federal, e lembrou avanços na CLDF, como o direito ao uso do nome social em concursos públicos e nos documentos post mortem, bem como a inauguração das primeiras casas de acolhimento da população LGBTQIA+ no país.

O deputado Max Maciel (Psol) declarou apoio à causa LGBTQIA+ na CLDF: “Agora tem mais um mandato à disposição para somar nessa luta. Nosso objetivo é estarmos juntos, trabalhando para todo esse processo avançar. Estamos nessa luta até o fim”. Segundo o endocrinologista do Ambulatório Trans, Márcio Garrison Dytz, a expectativa de vida dos transgêneros no Brasil é de 35 anos, principalmente por causa de alto índice de homicídio e suicídio, além da exclusão social e dificuldade de acesso a serviços básicos, como os de saúde.

O médico da família do Ambulatório Trans e do Adolescentro, Luiz Fernando Marques, defendeu o aprimoramento dos serviços de saúde para a população trans em todos os níveis de atenção. “Existe necessidade de equipes de serviços especializados para algumas questões específicas como o processo transexualizador, e esses cuidados devem ser extensivos aos familiares”, afirmou. De acordo com ele, o Adolescentro atende 120 jovens em suas necessidades biopsicossociais, somando cerca de 400 adolescentes já acolhidos. O Ambulatório, voltado a maiores de 18 anos, já prestou atendimento a 540 pessoas, mas a fila de espera é de dois anos.
 

A secretária Nacional dos Direitos da População LGBTQIA+ do Ministério dos Direitos Humanos, Symmy Larrat, relatou que o cenário encontrado no Governo Federal foi de “terra arrasada, de perseguição total”. Ela acredita que o contexto ainda é desafiador para o segmento no Brasil, como ilustra, segundo ela, um pedido de assinatura para abertura de CPI na Câmara dos Deputados “contra a sexualização de crianças”: “A justificativa é tenebrosa, embrulha o estômago mesmo, e é o que a gente já começa a enfrentar nesse período”.

Para a assessora de Políticas de Inclusão, Diversidade e Equidade em Saúde da Secretaria de Vigilância Sanitária e Ambiente do Ministério da Saúde, Alícia Krüger, é preciso vencer a dicotomia entre universalidade e equidade. “Coloco a equidade como ferramenta para a gente perseguir a universalidade que o SUS nos prerroga e também a igualdade que a Constituição Cidadã nos traz”. O coordenador jurídico do Instituto Brasileiro de Transmasculinidade, Kaleb Giulia, defendeu o fortalecimento do Ambulatório, do qual é usuário: “É através dele que em teoria a gente teria acesso à humanização, a cirurgias, e também a nossas consultas, que estão extremante escassas pelo grande volume de procura que temos no laboratório aqui do DF.

Segundo a integrante da Anavtrans, da Fonatrans e da Rede Afro LGBT, Ludymilla Santiago, o Ambulatório Trans só existe por força do movimento social e de alguns profissionais. Ela frisou que a conquista foi graças ao empenho do Ministério Público e a uma decisão da Justiça. Também criticou a ausência de legislação que “verse sobre nossas identidades” e defendeu a adoção de políticas de Estado: “A Secretaria de Saúde (SES), de fato, tem vários profissionais extremamente capazes para que a gente consiga fazer com que a saúde dessa população seja levada a sério. Mas o que a gente precisa nesse momento é de compromisso”.

De acordo com a promotora de Justiça do Núcleo de Direitos Humanos do MPDF, Cíntia Costa da Silva, o Ambulatório tem hoje uma equipe “significamente inferior às reais necessidades”, argumentando que há uma fila com mais de 500 pessoas, mais do dobro de 2020. Ela criticou a ausência de um profissional técnico responsável pelo equipamento e cobrou compromisso transversal das secretarias do DF no atendimento a esse público, bem como equipamento especializado em crianças com inconformidade de gênero no DF. “Todos os equipamentos da Secretaria de Saúde têm que ter esse trabalho de acolhimento e atendimento efetivo e qualificado às pessoas trans, travestis, e não binárias”, defendeu.

Segundo a subsecretária de Atenção Integral à Saúde da SES, Eddi Sofia Serícia, o Ambulatório realizou 2636 atendimentos em 2022, com destaque para os psicológicos (621) e psiquiátricos (403). Ainda de acordo com ela, o equipamento “é muito bem organizado, estruturado”, mas projetos previstos para seu aprimoramento atrasaram por causa da pandemia. Ela disse que a disponibilidade de medicamentos hormonais depende de autorização do Ministério da Saúde ou por meio de lei distrital. “A Anvisa reconhece como uso off label”, argumentou.
 

 

O paciente do Adolescentro, Isaac Vilela de Vasconcelos, relatou a dificuldade de atendimento nas redes privada e pública de Saúde: “Eu exaltaria muito o trabalho do Adolescentro porque é onde eu, pela primeira vez, consegui encontrar profissionais que fossem realmente acolhedores e tratassem dessa situação com seriedade”.

A assistente social Mariana Mota enfatizou a importância da Câmara Técnica de Saúde LGBTQIA+ da SES, da qual faz parte: “É um ganho na direção da concretização dos princípios do SUS de integralidade e universalidade, assim como um pequeno passo na direção da equidade e da construção de uma sociedade menos desigual e injusta”.

Ao final da audiência, Fábio Félix se comprometeu a financiar a disponibilização de hormônio pela SES via emenda parlamentar e apresentar projeto de lei de sobre a atenção geral à saúde da população trans.

Mario Espinheira - Agência CLDF