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Críticas e ausência do GDF marcam audiência sobre construção de viaduto na Epig

Publicado em 02/09/2021 16h35

Foto: Reprodução/TV Web CLDF

Para o deputado Fábio Felix, a obra impactará “toda a concepção da cidade” e simboliza a política de estímulo do GDF ao transporte individual

Para o deputado Fábio Felix, a obra impactará “toda a concepção da cidade” e simboliza a política de estímulo do GDF ao transporte individual

A Câmara Legislativa realizou audiência pública remota nesta quinta-feira (2) para debater a construção de um viaduto entre o Sudoeste e o Parque da Cidade, na Estrada Parque Indústrias Gráficas (Epig). Autor da iniciativa, o deputado Fábio Félix (Psol) criticou a ausência de representantes do Governo do Distrito Federal (GDF). “Há interesse total da sociedade civil, de especialistas, de representantes de universidades, do Poder Legislativo, do Ministério Público de fazer um debate sobre o significado da construção desse viaduto e dos impactos ambientais, espaciais, urbanísticos na cidade, e infelizmente os responsáveis se permitem a não comparecer”, afirmou.

Para o distrital, a obra impactará “toda a concepção da cidade” e simboliza a política de estímulo do GDF ao transporte individual. “É prioridade neste momento a construção de um viaduto no Sudoeste ou a garantia de melhoria da condição do transporte público para a população do DF?”, questionou. A deputada Arlete Sampaio (PT), coautora da audiência, disse que enviou requerimento à Secretaria de Obras para esclarecimentos sobre a intervenção e que ainda não foi atendida. Entre as informações solicitadas, ela questiona a falta de consulta aos moradores diretamente impactados, a descrição da compensação ambiental, e a existência de licenciamento ambiental e estudos sobre o impacto de vizinhança.

A parlamentar considerou como um “desrespeito absoluto” a ausência do GDF na audiência e criticou a falta de transparência: “Não responde ao requerimento de informação e não se faz presente para prestar contas ao parlamento. Se o governador pensa que ele é o imperador de Brasília, que ele faz o que quer nessa cidade, está enganado”. Para ela, a obra “vai transformar o Parque da Cidade em uma Via Expressa”. 

De acordo com o professor do Departamento de Engenharia da UNB e representante dos moradores do Sudoeste, José Humberto de Paula, o projeto não é de apenas um viaduto, mas de um trevo rodoviário, e ocupará uma área equivalente a 12 campos de futebol. “Vai tudo de encontro às escalas residenciais, bucólicas e gregária local”, reforçou. Ainda segundo ele, a área do Parque da Cidade afetada soma cerca de 60 mil metros quadrados, resultando numa “supressão vegetal descomunal”. 

Também representante da sociedade civil, Cleide Lemos relatou que os moradores do Sudoeste ficaram “alarmados” com a marcação de mais de 600 árvores apenas no bairro. Ela criticou a ausência de diálogo com o Governo, afirmando que há um abaixo-assinado físico com mais de 700 nomes e uma petição online com cerca de 2500 assinaturas contra a intervenção. “Não houve discussão com a comunidade, ao contrário do que o GDF diz, sobre essa obra”, frisou.
Cadeirante e integrante da Rede Urbanidade, Maria Lúcia Veloso relatou que “tem enfrentado” obstáculos à acessibilidade no Sudoeste. “Tenho constatado, cada vez mais, a prioridade dada na cidade ao transporte automotivo individual, opção que está na contramão das boas práticas para alcançarmos uma cidade sustentável e inclusiva”, afirmou. Ela questionou a necessidade da obra que, para ela, representa “mais um muro de Berlim dentro da cidade”.

Cidade-Parque

Para o ciclista e criador do blog Brasília para Pessoas, Uirá Lourenço, a obra revela a ênfase do GDF no transporte individual e causará uma “grande cicatriz” na cidade. Segundo ele, já foram derrubadas “várias árvores frondosas” e no local que será afetado vivem variadas espécies de pássaros como corujas, tucanos, pica-paus, araras e anus. “Essa obra representa a despedida da Cidade-Parque”, enfatizou.

O representante da Associação Andar a Pé, Wilde Cardoso Júnior, argumentou que os viadutos “são o símbolo do atraso da elite” e que o projeto é “conceitualmente equivocado, caro e feito na véspera de eleição”. No entanto, para ele, a obra dará visibilidade negativa ao GDF. “Estamos sendo atropelados por uma política com conceito retrógrado e a gente precisa se mobilizar no sentido de fazer com que as leis possam valer e a sociedade tenha sua vez”, afirmou. 

De acordo com professor do Departamento de Engenharia Civil e Ambiental da Unb, Paulo Cesar da Silva, a Política Nacional de Mobilidade Urbana exige a participação popular e o controle social. Portanto, para ele, o início da intervenção sem a realização de audiência é ilegal. Ele argumentou que não há problemas no trânsito que justifique o projeto e enfatizou que se trata de “um crime contra o futuro da cidade”, pois a proposta “cria um corredor expresso por dentro do Parque”. O professor da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da UNB, Benny Schasberg, disse que a obra é extensa e não conta com estudos de impacto. “São quase duas superquadras o tamanho dessa obra megalômana, com os impactos óbvios do ponto de vista urbanístico, ambiental e na mobilidade urbana”. 

Para o promotor da 1ª Promotoria de Justiça de Defesa da Ordem Urbanística, Dênio Moura, a justiça foi induzida em erro pelo GDF quando cassou a liminar que impedia a obra. Ele frisou que o próprio Ministério Público (MP) tem tido dificuldade de conseguir informações sobre a obra, orçada em R$ 27 milhões, o que impede a própria sociedade de se manifestar. O direito da participação popular neste tipo de intervenção, ainda segundo o promotor, é garantido pelo Plano Diretor de Transporte Urbano de Mobilidade do DF (PDTU/DF), pelo Plano Nacional de Mobilidade Urbana e pelo Estatuto da Cidade. Portanto, para ele, os atos da obra devem ser anulados “O MP vai se manifestar no momento oportuno por meio das medidas processuais cabíveis”, ressaltou.

A deputada federal Erika Kokay (PT-DF) afirmou que a construção do viaduto vai impedir que as pessoas se desloquem entre as quadras de bicicleta ou a pé, “numa lógica de coibir os espaços comunitários na cidade”. Para ela, a intervenção representa uma “imposição de estilos de vida e o esmagamento das pessoas”. A parlamentar defendeu a formulação de um manifesto que envolva “todas as entidades que lutam contra esse atentado ao bem-viver” e disse que convocará o Ministro do Turismo e tentará ouvir o presidente do Iphan para dar esclarecimentos na Câmara dos Deputados. Kokay também destacou que “há interesses econômicos” na obra e que o GDF demostrou “arrogância” ao não participar da audiência.

A coordenadora da ONG Rodas da Paz, Renata Aragão, afirmou que é preciso desestimular o uso de veículos e que a obra é “contrária a vida e a favor da velocidade”. Para ela, a intervenção tem caráter eleitoreiro e reduzirá a qualidade de vida da população. “São desculpas, desrespeitos, ausências, falta de transparência, e falta de amor à vida dos ciclistas, dos pedestres, dos cadeirantes e das árvores”, criticou.

Ao fim da audiência, Fábio Félix anunciou que vai requerer a realização de uma Comissão Geral, com previsão para o dia 16/9, com objetivo de ouvir os esclarecimentos, em plenário, do secretário de Obras e Infraestrutura do DF, Luciano Carvalho. O distrital afirmou ainda que tentará marcar uma audiência com o governador e com representantes do Instituto Brasília Ambiental e da Secretaria de Transporte e Mobilidade.

Mario Espinheira - Agência CLDF