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Audiência aponta irregularidades técnicas e legais do Museu da Bíblia

Publicado em 13/08/2021 12h44

Foto: Reprodução/TV Web CLDF

Para o deputado Fábio Félix, a prioridade do GDF deveria ser a recuperação de museus que estão abandonados ou que precisam de reformas. Outro ponto criticado pelo parlamentar foi o suposto favorecimento de apenas um segmento religioso

Para o deputado Fábio Félix, a prioridade do GDF deveria ser a recuperação de museus que estão abandonados ou que precisam de reformas. Outro ponto criticado pelo parlamentar foi o suposto favorecimento de apenas um segmento religioso

Em audiência pública da Câmara Legislativa (CLDF) na noite desta quinta-feira (12), arquitetos e representantes da sociedade civil e do setor cultural apontaram irregularidades técnicas e legais no projeto de construção do Museu da Bíblia no Eixo Monumental de Brasília. De acordo com o autor do debate, Fábio Félix (Psol), o equipamento, orçado em R$ 26 milhões, representa investimento maior do que todo o valor executado pelo DF via Lei Aldir Blanc. Ele também afirmou que não há transparência no processo e que a sociedade não foi ouvida. “A falta de diálogo resulta em ilegalidade, já que a Lei Orgânica estabelece rede de órgãos que precisa ser ouvida, como os Conselhos de Cultura”.

Para Fábio Félix, a prioridade do Governo do Distrito Federal (GDF) deveria ser a recuperação de museus que estão abandonados ou que precisam de reformas. Outra preocupação do parlamentar foi o possível favorecimento de apenas um segmento religioso, já que, segundo ele, o terreno foi doado pelo GDF para uma entidade evangélica privada, a Sociedade Bíblica do Brasil.

O distrital defendeu a suspensão do projeto para que haja uma discussão ampla, bem como a formação de grupo de trabalho para aprofundar o debate e promover ações judiciais contra as possíveis ilegalidades. Ele também apresentará projeto para revogar a lei que criou o museu.

A presidente do Conselho Regional de Cultura do Plano Piloto, Dayse Hansa, afirmou que o Projeto não atende às necessidades públicas, ressaltando que os equipamentos existentes é que deveriam ser revitalizados, como o Teatro Nacional, fechado há 10 anos. “Essa é uma das nossas prioridades. É inadmissível que um teatro tão importante para a cultura da nossa cidade e do nosso país ainda se mantenha fechado”.  Como desdobramento da audiência, Hansa defendeu a formação de um grupo de trabalho com representantes do GDF, do Ministério Público e da CLDF “para analisar as questões e encaminhar ao TCDF”. Sugeriu também a criação de outro grupo de para a criação, até o fim do ano, de um plano de gestão de todos os equipamentos culturais do DF. “É tempo de cuidarmos do nosso patrimônio material e imaterial, da cultura e dos agentes culturais”.

Irregularidades

Membro do Conselho de Arquitetura e Urbanismo do DF, Luiz Otávio Rodrigues apontou “série de equívocos” no edital de licitação do projeto. Entre eles, o fato de ser um equipamento público destinado a uma religião específica, em detrimento das demais. “Trata-se da aplicação do dinheiro público, de todos os contribuintes, para privilegiar apenas pequena parcela da sociedade”. Também destacou a falta de exigência no edital de inscrição de equipe multidisciplinar para a elaboração dos projetos executivos; a falta de minuta de contrato com a discriminação dos respectivos valores dos serviços; a previsão de sorteio para a escolha do vencedor; e o desrespeito a legislação de direitos autorais.

Segundo a vice-presidente da regional Centro-Oeste do Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB), Laís Petra, esta é a nona vez que o GDF tenta construir o Museu. Ela relatou que o IAB encontrou “diversas irregularidades” no concurso, mas a impugnação foi dificultada: “De cara, o concurso não cumpre o próprio edital”. Petro afirmou que é obrigatório o contrato anexado; que houve subdimensionamento da equipe e a previsão de um prazo muito curto. “Quem fez não tem a menor ideia de como funciona um projeto de arquitetura. É totalmente impossível cumprir esse programa, não dá nem sequer para fazer o projeto legal”.

Para o advogado da Associação de Ateus e Agnósticos, Thales Bouchaton, o Museu da Bíblia “faz parte do projeto de captura do Estado por segmentos religiosos”. Ele também afirmou que o governador, Ibaneis Rocha, está utilizando o projeto para fins eleitorais. “O GDF, numa atitude absolutamente antidemocrática, cerceou qualquer debate”, ressaltou. Segundo o museólogo Newton Fabiano, o GDF “tem uma relação de violência” com cultura. “Todo ano é de pandemia para quem trabalha nos museus do DF, porque é um ano sem orçamento, planejamento e equipe”. Para ele, o Museu da Bíblia será “um equipamento particular, embora com verbas públicas”.

O historiador e membro da Associação Amigos do Centro Histórico de Planaltina, Yuri Soares, defendeu a recuperação de equipamentos existentes. “Discutir a criação de um espaço cultural religioso enquanto vários espaços estão abandonados é um escárnio com a população e com as nossas políticas culturais. A nossa urgência é evitar que o patrimônio já existente não caia aos pedaços”, criticou. Para o professor do departamento de Arquitetura e Urbanismo da UNB, Frederico Flósculo, o projeto fere os princípios republicanos, sendo o concurso feito “de uma maneira totalmente picareta”. Ele afirmou que o DF tem “gravíssimas falhas de laicismo”, com a ocorrência de um “tipo de aliança espúria entre lideranças religiosas que ficam usando o nome de Deus para se eleger e ter poder político e econômico”.

Único representante do GDF, o subsecretário de Gerenciamento de Recursos Externos, Guilherme Coelho, explicou que as verbas das emendas parlamentares federais destinas ao projeto, que somam R$ 14 milhões, estão no Ministério do Turismo e serão repassadas pela Caixa a partir das medições das etapas da obra.

Mario Espinheira - Agência CLDF

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