(Autoria: Deputada Arlete Sampaio)
Altera a Lei nº 6.914, de 22 de julho de 2021, que “Dispõe sobre a produção, o transporte, o comércio, o uso, o armazenamento, a prestação de serviços, o destino final dos resíduos e embalagens vazias, o cadastro, o controle, a auditoria, a inspeção e a fiscalização dos agrotóxicos e afins e dá outras providências”.
A CÂMARA LEGISLATIVA DO DISTRITO FEDERAL decreta:
Art. 1º A Lei nº 6.914, de 22 de julho de 2021, passa a vigorar com a seguinte redação:
“Art. 6º-A. Salvo em casos excepcionais, desde que devidamente autorizado pelos órgãos competentes, fica vedada a aplicação de agrotóxicos, seus componentes e afins por via aérea ou por meio de pivô central no Distrito Federal”.
Art. 2º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
Art. 3º Revogam-se as disposições em contrário.
JUSTIFICAÇÃO
A Proposição visa reestabelecer o dispositivo da Lei nº 414, de 15 de janeiro de 1993, que “Dispõe sobre produção, armazenamento, comercialização, transporte, consumo, uso, controle, inspeção, fiscalização e destino final de agrotóxicos, seus componentes e afins no Distrito Federal e dá outras providências”, posteriormente revogado pela Lei nº 6.914, de 22 de julho de 2021.
Preliminarmente, cumpre esclarecer que o Supremo Tribunal Federal, no Segundo Julgamento do Agravo Regimental no Recurso Extraordinário com Agravo nº 748.206-SC, validou a competência municipal para legislar de modo supletivo sobre restrições ao uso de herbicidas (e afins), nos termos do Acórdão recorrido, in verbis:
“APELAÇÃO CÍVEL EM MANDADO DE SEGURANÇA PREVENTIVO. AMBIENTAL. LEI MUNICIPAL N. 1.382/2000. IMPOSIÇÃO DE RESTRIÇÃO AO USO DO HERBICIDA À BASE DE 2.4 D. COMPETÊNCIA MUNICIPAL SUPLETIVA PARA LEGISLAR. INTERESSE LOCAL CONFIGURADO. POSSIBILIDADE. EXEGESE DO ART. 30, I, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA E DO ART. 11 DA LEI N. 7.802/89. OBSERVÂNCIA DOS PRINCÍPIOS DE DIREITO AMBIENTAL DA PRECAUÇÃO E DA PREVENÇÃO. PRODUTO NOCIVO À SAÚDE DO SER HUMANO E AO MEIO AMBIENTE. PRECEDENTES. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO
Ao final de 2018, a Human Rights Watch condenou a utilização e aplicação de agrotóxicos por meio de dispersão aérea, em documento intitulado “Você não quer mais respirar veneno - As falhas do Brasil na proteção de comunidades rurais expostas à dispersão de agrotóxicos[1]”.
De acordo com a Organização, “pessoas comuns, em suas rotinas diárias, são expostas a tóxicas aplicações de agrotóxicos que ocorrem com frequência nas proximidades de suas casas, escolas e locais de trabalho. Elas são expostas quando os agrotóxicos pulverizados em plantações se dispersam durante a aplicação ou quando os agrotóxicos evaporam e seguem para áreas adjacentes nos dias após a pulverização”.
De julho de 2017 a abril de 2018, a Human Rights Watch entrevistou 73 pessoas afetadas pela deriva de agrotóxicos em sete locais em zonas rurais no Brasil, incluindo comunidades rurais, comunidades indígenas, comunidades quilombolas e escolas rurais. Esses locais estão localizados nas cinco regiões geográficas do Brasil. Em todos os locais, as pessoas descreveram sintomas consistentes com a intoxicação aguda por agrotóxicos após verem pulverização de agrotóxicos nas proximidades, ou sentirem o cheiro de agrotóxicos recentemente aplicados em plantações próximas. Esses sintomas geralmente incluem sudorese, frequência cardíaca elevada e vômitos, além de náusea, dor de cabeça e tontura.
Em muitos casos, não há legislação nacional, estadual ou municipal que proteja as pessoas da deriva de agrotóxicos. Não existe uma regulamentação nacional que estabeleça uma zona de segurança em torno de locais sensíveis onde a pulverização terrestre de agrotóxicos seja proibida; e a maioria dos estados tampouco possui uma lei desse tipo. A Human Rights Watch constatou ainda que, mesmo nos poucos estados que estipulam zonas de segurança para a pulverização terrestre, essas regras são frequentemente desrespeitadas.
Do ponto de vista técnico, a pulverização aérea é comprovadamente método de baixa eficácia, uma vez que parcela significativa dos agrotóxicos aplicados não chega até a planta. De acordo com a Nota Técnica da Fiocruz sobre pulverização de agrotóxicos no Estado do Ceará[2] “estudos realizados no Brasil e no mundo apontam perdas variando entre 34,5% e 99,98%. O tema foi objeto de análise na própria Câmara Federal, e dados do relatório produzido pela subcomissão especial que tratou da matéria revelam que 70% do agrotóxico aplicado por avião não atinge o alvo. [...] O veneno que não atinge o seu alvo contamina solos, aquíferos superficiais e subterrâneos, plantações vizinhas, florestas e, muitas vezes, áreas residenciais, causando danos ao meio ambiente e à saúde de populações expostas. Assim, tem-se que o risco de atingir o ambiente e espécies não-alvo é permanente, e não apenas incidental”.
A Nota rebate ainda argumentos dos defensores da pulverização aérea, no sentido de que não há precisão tecnológica na utilização dos agrotóxicos por pulverização aérea “diante da ocorrência das derivas, bem como pela observação frequente da contaminação ambiental, dos relatos de populações atingidas e da ocorrência de danos à saúde humana relacionados à pulverização aérea em diferentes partes do globo”.
Assim, o Distrito Federal precisa urgentemente adotar medidas para limitar a exposição a agrotóxicos que são prejudiciais à saúde humana, impondo restrição à utilização de dispersão aérea como exceção ao uso de agrotóxicos e afins, assegurando, assim, maior segurança a nossa população.
Por todo exposto, conclamo os presentes Pares pela aprovação do Projeto.
Sala das Sessões, em de 2022.
ARLETE SAMPAIO
Deputada Distrital
[1] https://www.hrw.org/sites/default/files/report_pdf/brazil0718port_insert_lowres_webspreads.pdf
[2] https://www.renatoroseno.com.br/files/3/2/0/3200528-Nota-T%C3%A9cnica-Pulveriza%C3%A7%C3%A3o-a%C3%A9rea-CE.pdf