(Autoria: Deputado Leandro Grass)
Manifesta Moção de Repúdio à Resolução nº 2.342/2022, do Conselho Federal de Medicina, que restringiu sobremaneira o uso medicinal do canabidiol em âmbito nacional.
Excelentíssimo Senhor Presidente da CÂMARA LEGISLATIVA DO DISTRITO FEDERAL:
Com base no art. 144 do Regimento Interno desta Casa de Leis, proponho aos nobres pares moção de repúdio à Resolução nº 2.342/2022, do Conselho Federal de Medicina, que restringiu sobremaneira o uso medicinal do canabidiol em âmbito nacional.
JUSTIFICAÇÃO
No último dia 14 de outubro de 2022 o Conselho Federal de Medicina fez publicar no Diário Oficial da União a Resolução nº 2.324/2022, que restringiu, sobremaneira, o uso medicinal do canabidiol, permitindo-se tão somente a prescrição daquela substância para tratamento de epilepsias da criança e do adolescente refratárias às terapias convencionais na Síndrome de Dravet e Lennox-Gastaut e no Complexo de Esclerose Tuberosa.
Em primeiro, cumpre destacar que isso indica retrocesso sem igual. Há inúmeros estudos e pesquisas em andamento, que demonstram, de forma cabal, a utilidade do canabidiol não somente para as hipóteses acima elencadas. Somente aqui no Distrito Federal, há pesquisas em andamento na Universidade de Brasília e na Universidade Católica.
Por outro lado, há três aspectos que são especialmente importantes na análise do caso. A primeira delas é a autonomia do profissional. Recorde-se o fato de que, quando da polêmica relacionada ao uso da cloroquina e da ivermectina para o tratamento da Covid-19, em que os médicos tiveram total autonomia para decidirem, em conjunto com o paciente, a melhor conduta adotada, desde que o consentimento livre e esclarecido. Era a inteligência do parecer nº 4/2020, do mesmo Conselho.
Assim, parece ser absolutamente contraditório impedir o uso, consentido, por óbvio, do canabidiol. Reitere-se o fato de que eventuais abusos podem e devem ser analisados pelo CFM, mas restringir o seu uso unicamente para determinados casos, afastando-se todos os demais, a despeito da evolução científica do tema e da ANVISA já ter concedido registro para 18 medicamentos com princípio ativo derivado da cannabis, revela, a não mais poder, a incursão na autonomia do profissional.
No caso do Distrito Federal, a questão se torna ainda mais grave, sobretudo pelo fato de que nossa unidade federativa é a quem possui o maior número de autorizações para importação de produtos de cannabis por 100 mil habitantes, consoante pesquisa realizada pela Associação Brasileira das Indústrias de Canabinoides (BRCann) e retratada pelo Correio Braziliense, conforme se verifica do excerto a seguir:
O Distrito Federal segue com a maior taxa do Brasil de pacientes autorizados a importar produtos derivados do canabidiol (CBD) para uso medicinal. Na capital, a cada 100 mil habitantes, 121 estão no rol de concessões da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Os números são da Associação Brasileira das Indústrias de Canabinoides (BRCann). Na última pesquisa, divulgada em 6 de dezembro de 2021, o DF tinha 35 autorizações/100 habitantes. O crescimento se comprova nos números absolutos. Foram concedidas 40.191 novas autorizações para importação destes produtos no ano passado contra 19.150 em 2020.
O diretor-executivo da BRCann, Tarso Araújo, afirma que o investimentos das empresas do setor em educação médica continuada e as autorizações sanitárias que permitiram a chegada de novos produtos nas farmácias, o que aumenta a confiança de médicos e pacientes, estão entre os fatores que contribuem para o avanço das importações. “A chegada de produtos de cannabis nas farmácias tradicionais tem despertado maior interesse sobre os tratamentos e impulsionado as prescrições”, aponta o gestor.
Apesar de 15 produtos já terem recebido autorização sanitária da Anvisa para comercialização nas farmácias, a maioria só deve chegar às prateleiras no segundo semestre de 2022 ou no primeiro semestre de 2023, de acordo com a BRCann. Ainda segundo a instituição, a baixa oferta tem influenciado os pacientes a buscarem opções de produtos via importação, diante da ampla variedade de formulações e preços. (Disponível em https://www.correiobraziliense.com.br/cidades-df/2022/05/5009175-df-segue-como-maior-utilizador-de-cannabis-medicinal-do-pais.html. Acesso em 17.10.2022, às 14h06).
Assim, a restrição havida nos parece, além de retirar a autonomia da relação profissional paciente, prejudicar a população do Distrito Federal e, porque não, de todo o Brasil.
Por outro lado, a resolução, de forma inédita, traz a indicações dos fundamentos bibliográficos. Sucede que a simples leitura dos fundamentos bibliográficos mostra que as novas pesquisas, desde o ano de 2015, sequer estão presentes, ao passo que há várias citações dos anos 1970 a 1990. Esse fator também foi recordado pelo advogado Henderson Furst, Presidente da Presidente da Comissão Especial de Bioética e Biodireito da OAB Nacional, cuja análise pode ser acessada no endereço a seguir: http://genjuridico.com.br/2022/10/14/consideracoes-res-2-324-2022-cfm/. Acesso em 17.10.2022, às 14h10. Destaque para trecho do artigo do referido advogado:
Ocorre que, dentre a bibliografia citada, não há qualquer produção científica dos últimos 7 anos. Sim, não é possível ver uma única pesquisa de 2015 em diante sendo citado, ao passo que fartam citações dos anos 1970 a 1990. Por mais relevante que seja a revisão bibliográfica histórica, a opção regulatória necessariamente precisa dialogar com as evidências mais recentes, senão se tratará de uma resolução que já nasce desatualizada.
Por fim e não menos sem problema, urge destacar que a resolução traz uma séria restrição à atividade científica, especialmente em razão do disposto em seu artigo 3º, II, cujo teor ora se destaca:
Art. 3º É vedado ao médico:
(…)
II - ministrar palestras e cursos sobre uso do canabidiol e/ou produtos derivados de Cannabis fora do ambiente científico, bem como fazer divulgação publicitária.
Indaga-se: um evento no âmbito empresarial, por exemplo, ensejará na vedação ao médico em participar? Ou ainda, um seminário feito por uma entidade de classe que tenha interface no tema, como a Ordem dos Advogados do Brasil? Nota-se, portanto, que há uma restrição que, à primeira vista, parece ser indevida.
Recordo que esta Câmara Legislativa promoveu um seminário sobre o uso medicinal da cannabis, entre os dias 19 e 20 de maio de 2022 e, naquela assentada, pudemos verificar a importância do uso medicinal da cannabis e da sua importância para o Distrito Federal. Recordo ainda que esta Casa aprovou e o governador sancionou a Lei 6.839/2021, que Dispõe sobre o incentivo à pesquisa científica com Cannabis spp. para uso medicinal no Distrito Federal e dá outras providências.
Assim, o Parlamento já reconheceu a importância do tema e a resolução, em um primeiro momento, demonstra um retrocesso a olhos vistos, razão pela qual a moção ora requerida deve ser aprovada.
Pelo exposto, solicito aos nobres parlamentares apoio para aprovação da presente Moção de Repúdio, considerando a gravidade do fato ocorrido.
Sala das Sessões em, 16 de outubro de 2022.
DEPUTADO LEANDRO GRASS
Partido Verde