(Autoria: Deputado José Gomes)
Proíbe os profissionais de saúde e as operadoras de planos de assistência ou seguro à saúde de exigir o consentimento de cônjuge, familiar ou companheiro (a) para realizar ou autorizar os procedimentos de inserção dos métodos contraceptivos no Distrito Federal.
A CÂMARA LEGISLATIVA DO DISTRITO FEDERAL decreta:
Artigo 1º – Esta lei objetiva garantir a autonomia e assegurar o acesso à saúde e à liberdade reprodutiva e sexual das mulheres, que pretendam fazer uso de métodos contraceptivos no âmbito do Distrito Federal.
Artigo 2º – É vedada aos profissionais de saúde, bem como às operadoras de planos de assistência ou seguro à saúde, a exigência do consentimento de cônjuge, familiar ou companheiro (a) para realizar ou autorizar a realização de procedimentos contraceptivos, tais como: inserção de dispositivo intrauterino (DIU); implante contraceptivo; injeção anticoncepcional; dentre outros, no Distrito Federal.
Parágrafo único – Consideram-se abusivas as exigências descritas no caput deste artigo, sob pena de colocar em risco a saúde física e psíquica da mulher.
Artigo 3º – O descumprimento das disposições desta lei sujeitará o infrator às penalidades previstas no Código de Defesa do Consumidor, nos termos dos arts. 56 e 57, devendo a multa ser estipulada em regulamentação própria do Procon/DF e revertida para o Fundo de Defesa dos Direitos do Consumidor (FDDC).
Artigo 4º – Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.
JUSTIFICAÇÃO
Segundo a Constituição Federal, a competência para tratar do tema em tela é concorrente, haja vista que a competência da União para legislar sobre normas gerais não exclui a competência suplementar dos Estados e, inexistindo lei federal sobre normas gerais, os Estados exercerão a competência legislativa plena, para atender a suas peculiaridades.
Nesse sentido, ausente legislação geral acerca de métodos contraceptivos e visando proteger a autonomia da mulher e da consumidora, cabe ao Distrito Federal, à luz da igualdade constitucional entre homens e mulheres, versar sobre a referida proibição. Ressalta-se a diferença entre método contraceptivo e método de esterilização, sendo este último definitivo, permanente, e sobre o qual já há disposição em Lei Federal, ou seja, Lei nº 9.263/92.
É dever do Estado, conforme a Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher (aprovada pelo Decreto Legislativo nº 93, de 14 de novembro de 1983, e promulgada pelo Decreto nº 89.406, de 1º de fevereiro de 1984) não apenas consagrar o princípio da igualdade do homem e da mulher, mas também assegurar por lei outros meios apropriados a realização prática desse princípio.
E para tal devem ser adotadas “todas as medidas adequadas, inclusive de caráter legislativo, para modificar ou derrogar leis, regulamentos, usos e práticas que constituam discriminação contra a mulher”, abrangidas, aqui, as discriminações na esfera dos cuidados médicos “a fim de assegurar, em condições de igualdade entre homens e mulheres, o acesso a serviços médicos, inclusive os referentes ao planejamento familiar” (vide art. 12 da Convenção).
Essa determinação também corrobora os princípios adotados pela Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher, promulgada pelo Decreto nº 1.973/1996.
O livre acesso a métodos contraceptivos é parte essencial da garantia do planejamento familiar, considerado pela Lei nº 9.263/92 como “parte integrante do conjunto de ações de atenção à mulher, ao homem ou ao casal, dentro de uma visão de atendimento global e integral à saúde”, e que deve ser orientado por “ações preventivas e educativas e pela garantia de acesso igualitário a informações, meios, métodos e técnicas disponíveis para a regulação da fecundidade”.
Resta claro, desta forma, o dever do legislador em todas as esferas de atuar ativamente para a garantia dos princípios constitucionais e dos direitos humanos para as mulheres, em consonância com o entendimento da Suprema Corte conforme exposto na Cartilha de Proteção da Mulher:
(...) uma efetiva igualdade substantiva de proteção jurídica da mulher contra a violência baseada em gênero exige atuação positiva do legislador, superando qualquer concepção meramente formal de igualdade, de modo a eliminar os obstáculos, sejam físicos, econômicos, sociais ou culturais, que impedem a sua concretização. Quando o ponto de partida é uma situação indesejável de desigualdade de fato, o fim desejado da igualdade jurídica (art. 5º, caput e I, da CF), materialmente, somente é alcançado ao se conferir aos desiguais tratamento desigual na medida da sua desigualdade”
[ADC 19, rel. min. Marco Aurélio, voto da min. Rosa Weber, j. 9-2-2012, P, DJE de 29-4-2014].
A desigualdade de gênero persiste, e por isso se justifica a criação da presente Lei numa conjuntura em que planos de saúde têm exigido consentimento de maridos e companheiros para realização do procedimento de inserção de DIU (dispositivo intrauterino), um método contraceptivo, em mulheres casadas ou em união estável, refletindo o machismo que vigora na sociedade.
É inadiável uma resposta do Poder Legislativo distrital para combater ativamente a discriminação contra a mulher, em respeito às garantias fundamentais da Constituição da República.
Assim, com o intuito de fomentar a discussão e a conscientização acerca desse importante tema, apresentamos o presente projeto de lei, e contamos com o apoio de nossos nobres pares para a sua aprovação.
Sala das Sessões, em
JOSÉ GOMES
Deputado Distrital